O estranho que nós amamos (2017)
O
estranho que nós amamos (2017), longa-metragem dirigido e
escrito por Sofia Coppola, com atuações de Nicole Kidman, Colin Farrell, Kirsten
Dunst, Elle Fanning, Angourie Rice, entre outros.
Sem
revelações significativas do enredo.
Quando é feito um remake em Hollywood, é praticamente
inevitável a sua comparação com a versão original. Este novo filme de Sofia
Coppola, contudo, tem o mérito de ser superior à versão de Don Siegel, de 1971,
com Clint Eastwood e Geraldine Page (que também conta com resenha neste blog).
O novo longa, inclusive, rendeu à diretora o prêmio de melhor direção no
Festival de Cannes de 2017.
O estranho que nós amamos se passa
durante a Guerra Civil dos Estados Unidos, ocasião na qual um soldado nortista
ferido é encontrado por um internato feminino confederado. Com receio de que o
homem possa morrer na prisão ao ser entregue às tropas oficiais, onde
certamente não receberia o tratamento adequado para sua lesão, a diretora do
internato decide recuperá-lo antes disso. Entregá-lo para a morte certa, tendo
a possibilidade de oferecer ajuda, como lembra uma das garotas, “não seria algo
muito cristão a se fazer”. Assim, o internato, com poucas estudantes restando
devido à guerra, encara a presença do estranho com um ar de novidade. Essas
estudantes, algumas na puberdade e outras próximas à idade adulta, ficam
curiosas com a repentina presença masculina, antes ausente na casa.
Dessa
maneira, o figurino do filme muito inteligentemente veste as mulheres do
internato com longos vestidos brancos ou em tons pastel, que, ao mesmo tempo,
traduzem a falta de personalidade geral (já que todas elas são educadas para se
tornarem o mesmo tipo de mulher) e remetem à sua “pureza”. É interessante
notar, nesse aspecto, como esses vestidos sem cor são substituídos por outros
mais coloridos e adornados na cena em que o cabo McBurney (Colin Farrell)
participa do jantar. Esta cena, inclusive, é marcada por um humor bastante perspicaz,
dado que as moças disputam de diferentes formas a atenção do soldado. É
marcante também o momento em que Edwina (Kirsten Dunst), após tomar uma decisão
importante em sua vida, aparece trajando um vestido de um azul intenso,
exibindo os ombros sem pudor.
Com
relação à versão de 1971, esta de 2017 é mais cuidadosa do ponto de vista
narrativo. A informação sobre os cogumelos e o desejo de Edwina de abandonar o
instituto conferem maior coesão narrativa ao roteiro escrito por Coppola.
Assim, determinadas decisões dos personagens passam a fazer mais sentido que na
versão original. Trata-se justamente de setup
e payoff. Em outras palavras, as
ideias que são essenciais ao enredo são apresentadas devidamente para que
quando surjam em determinado momento da história não pareçam aleatórias ou sem
sentido. Também o motivo da permanência daquelas moças no internato (mesmo em
meio à guerra) é devidamente explicado.
Além
disso, ponto interessante a se destacar é o design de som, que, embora não
tenha grandes desafios ao criar sons específicos (como o som de passos sobre o
piso de madeira da casa ou o de pássaros ao longe), cumpre eficazmente a função
de contribuir para a atmosfera do longa. Temos, então, a impressão de que é
impossível andar naquela imensa casa sem fazer barulho. Ouvimos sempre os
passos de alguém, mesmo sem saber de quem se trata. A trilha sonora, por sua
vez, é bastante ausente, aparecendo em raros momentos.
Quanto
às atuações, o John McBurney de Colin Farrell é bem menos “galã” que o de Clint
Eastwood no filme de 1971, porém bem mais agressivo e ameaçador. Kirsten Dunst
faz um bom trabalho como Edwina, principalmente por sua expressão sempre
desgostosa da vida que leva. A Miss Martha de Nicole Kidman, embora bem menos
intimidadora que a de Geraldine Page, é misteriosa e, mesmo nos momentos mais
delicados, parece não perder o controle da situação. A atriz consegue
transmitir essa segurança por meio de sua performance de maneira competente.
Em
suma, esta nova versão de O estranho que
nós amamos, de Sofia Coppola possui a sutileza e parcimônia que faltavam ao
original, como apontei alhures. Ademais, é também muito superior tecnicamente
ao filme de Don Siegel. Neste, aliás, o grande segredo de Miss Martha servia
basicamente como justificativa para os atos de McBurney. Estando tal subtrama
agora ausente, a personagem apenas menciona que havia alguém antes da guerra. O
único ponto negativo deste longa de 2017, a propósito, é que, após despertar o
interesse da audiência em descobrir mais detalhes sobre o passado de Miss
Martha, o filme nada entrega sobre ele. Assim, temos uma história simples, com
muito pouco da tensão sugerida pelo trailer, mas muito bem contada do ponto de
vista da técnica cinematográfica.
Avaliação:
4/5
Originalmente publicado no extinto site Papo Torto, em 4 de agosto de 2017.
Renan Almeida
é doutorando em Ciência Política na Universidade de Brasília. Possui mestrado e
bacharelado também em Ciência Política pela mesma universidade. Apaixonado por
cinema, literatura e quadrinhos, escreve resenhas e análises de filmes, livros
e HQs.
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